Política monetária Cenário prevê forte recuo de preços em 2016 Alex Ribeiro
Eduardo Campos
A adoção de premissas mais favoráveis para o repasse da alta do dólar para os preços, para a evolução do mercado de trabalho e para a potência da política monetária permitiram ao Banco Central apresentar, no seu relatório de inflação, um cenário de forte recuo da inflação em 2016, ano que elegeu como alvo principal da sua política de alta de juros.
Ainda assim, o Banco Central informa no documento, divulgado ontem, que não está satisfeito com os progressos, já que suas projeções ainda não indicam o cumprimento da meta de 4,5% e as expectativas de inflação do mercado estão mais altas do que as suas. Por isso, renovou sua mensagem de que a “política monetária está e continuará vigilante” para assegurar que a aceleração de preços ocorrida neste ano não contamine o próximo.
No relatório, o Banco Central aumentou, de 6,1% para 7,9%, sua projeção de inflação para 2015, em relação aos percentuais estimados na versão anterior do documento, de dezembro. Os exercícios foram feitos no chamado cenário de referência, que toma como pressuposto a manutenção da taxa de juros no percentual atual de 12,75% ao ano e a taxa de câmbio nos R$ 3,15 vigentes em 13 de março, data de corte para o relatório.
A majoração das projeções para 2015 não surpreende, diante das altas recentes de tarifas e do fortalecimento do dólar. O que chama a atenção é que o BC reduziu ligeiramente a sua projeção para 2016, de 5% para 4,9%, entre os relatórios de dezembro e março. Isso significa que, na visão do BC, as pressões inflacionárias vão ficar circunscritas a este ano, sem contaminar o próximo.
Nesse cenário, seria possível ter uma queda de inflação de três pontos percentuais entre 2015 e 2016. Isso só aconteceu duas vezes nos 16 anos de regime de metas de inflação no Brasil, entre 1999 e 2000 e entre 2002 e 2003.
Em apresentação do relatório de inflação, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Luiz Awazu Pereira, argumentou que há consenso também entre os analistas do mercado de que a inflação vai recuar no período.
A projeção mediana dos analistas aponta recuo da inflação de 8,12% para 5,61%, correspondentes a também significativos 2,5 pontos percentuais. De forma geral, disse Awazu, os analistas acreditam que a inflação em 12 meses vai cair consideravelmente no primeiro trimestre de 2016, quando for feito o “descarte” estatístico da inflação do primeiro trimestre de 2015, que foi pressionada pela alta de tarifas.
Ainda assim, a inflação prevista pelo BC para 2016, de 4,9%, é maior do que a prevista pelos analistas econômicos, de 5,61%. Awazu disse que essa diferença se deve, em parte, às premissas assumidas pelo Banco Central nos seus modelos de projeção, envolvendo, por exemplo, o repasse da alta do dólar para os preços domésticos, a evolução do mercado de trabalho e a maior potência da política monetária depois da inflexão da política fiscal.
O presidente do Banco Central Alexandre Tombim, já havia mencionado esses fatores em pelo menos dois discursos recentes. A novidade do relatório de inflação é a incorporação dessas premissas nas projeções oficiais de inflação e a sua apresentação de maneira mais formal, por meio de alguns estudos econômicos.
No caso do repasse da alta do dólar para a inflação, o BC apresenta dois boxes, um dos quais descreve como ela pode cair à metade pelo fato de os preços das commodities estarem recuando. Também contribui o fato de a economia estar desaquecida e a constatação de que não só o real se enfraqueceu diante o dólar, mas também moedas usadas por parceiros comerciais do Brasil.
Outra premissa favorável à queda da inflação adotada no cenário central de projeção do BC é a perspectiva de um mercado de trabalho menos apertado, que tende a alinhar reajustes salariais aos ganhos de produtividade. Isso estaria ocorrendo em parte devido ao aumento da chamada taxa de participação – com a oferta de trabalho por jovens que haviam se retirado do mercado para estudar. O Banco Central divulgou um boxe sobre o assunto no relatório.
Ao longo do corpo do relatório, o Banco Central também menciona, sucintamente, a tese de aumento da potência da política monetária. “O comitê destaca que a literatura e as melhores práticas internacionais recomendam um desenho de política fiscal consistente e sustentável, de modo a permitir que as ações de política fiscal sejam plenamente transmitidas aos preços”, diz o relatório de inflação.
Questionado em entrevista coletiva o quanto dessas premissas mais favoráveis já entraram nas projeções de inflação, Awazu disse que “obviamente incorporamos nos nossos modelos de projeção no nosso cenário central elementos importantes de modificação da intensidade desses parâmetros que explicam a transmissão da inflação de 2015 para 2016”.
O diretor do BC disse estar dente que há uma diferença de visões entre a autoridade monetária e a visão média de mercado. E indicou que esse é o debate que o BC vai estimular neste ano.
Isso não significa que o Banco Central esteja contando apenas com esses fatores para baixar a inflação – Awazu renovou os sinais de que os juros devem subir mais para assegurar a queda da inflação no próximo ano. “A principal mensagem desse relatório é que a política monetária está e continuará vigilante para assegurar a convergência da inflação à meta de 4,5% ao longo de 2016″, afirmou ele.
O quanto os juros ainda podem subir, num cido que já acumula alta de 5 pontos percentuais na Selic, e quando devem voltar a cair não foi claramente sinalizado pelo BC Mas projeções alternativas apresentadas no relatório de inflação, no chamado cenário de mercado, mostra que a trajetória para a taxa básica refletida na mediana das previsões para a Selic dos analistas de mercado é incompatível com um cenário de queda da inflação para o centro da meta em 2016.
O cenário de mercado contempla uma alta dos juros básicos para 13% ao ano, e uma queda para 11,5% ao ano em 2016. Adotando essa hipótese, a inflação projetada pelo BC para este ano é de 7,9%, mas de 5,1% em 2016. Maior, portanto, do que a de 4,9% prevista no cenário de referência para 2016, que assume como premissa a manutenção da taxa Selic em 12,75% ao ano durante todo o período de projeção da inflação. Ou seja, se os juros evoluírem como previsto pelo mercado, a meta de 4,5% de 2015 ficaria mais distante. O cenário de mercado incorpora uma taxa de câmbio de R$ 3,09 em fins de 2015 e R$ 3,11 em fins de 2016.
Economia – Varejo | Valor Econômico | Finanças | BR